Uma irreverência entre a memória e a saudade


Há um fio ténue que liga a memória com a saudade. Chamei-lhe irreverência porque ele se move constantemente e em todas as direcções fazendo-me lembrar o vento que, vindo do mar, me afaga desde que nasci...


sexta-feira, 15 de agosto de 2014

MADRUGADA

Não abras a janela, amor.
A noite não acordou ainda
e as estrelas não sabem contar o tempo
para avisar quando finda.
Aproveitemos as horas que nos restam
para acabarmos tudo quanto começámos.
São sempre bons estes restos que nos sobram
para permanecermos lado a lado saciados
amando-nos  entretanto apenas com o olhar.
Deixa-te ficar, inteiro, até que chegue o momento
em que terás mesmo de me deixar.
Quando saires, fecha a porta com um beijo,
o teu sinal secreto de me avisares
que vais, só porque tens de ir,
mas que com a luz da primeira estrela,
irás voltar.

SS

terça-feira, 12 de agosto de 2014

AS NOSSAS PALAVRAS

Houve um tempo
em que jogávamos com as palavras
como com os sentimentos.
Ambos tinham a mesma força
e o que diziam
sugeria-nos sempre emoções e sensações.
Cada palavra
longa
breve
fluente
inteligente
era pronunciada com doçura
e dava às nossas conversas
o desejado tom de debate
que abria infalivelmente a porta ao amor.

Agora que o tempo pressagia ser mais curto
tentemos recuperá-las para a nossa vida
devolvendo a cada uma o antigo sabor.


SS

domingo, 10 de agosto de 2014

NÓS

Perdemos o hábito de nós
Do nosso cheiro
do nosso calor
do nosso toque
da nossa pele
Sinto que tudo isso
não foi mais do que uma oferta tardia da vida
que recebemos sem esperar.
Depois
fomo-nos consumindo
no tempo, no espaço
e sempre na ausência.
Feito o balanço
do que existe ainda entre nós 
será que sobeja alguma coisa
que consigamos recuperar?


SS