Uma irreverência entre a memória e a saudade


Há um fio ténue que liga a memória com a saudade. Chamei-lhe irreverência porque ele se move constantemente e em todas as direcções fazendo-me lembrar o vento que, vindo do mar, me afaga desde que nasci...


domingo, 17 de abril de 2016

PURIFICAÇÃO

A brisa trouxe-me o aroma da maresia 
E os gritos das gaivotas 
Enquanto o sol se afogava para lá do mar 
E pintava de vermelho a túnica que me cobria. 
Entrei na água para me despir 
Do fogo que aquela luz acendera. 
Nadei seguindo uma linha que não via 
Mas que acreditava que me iria levar 
a um lugar do horizonte 
Onde recuperasse na minha nudez 
A veste branca perdida 
e o meu ser fosse devolvido à lua 
A que pertenço 

Soror S

Diferença

Numa conversa banal 
Descobri Afinal 
Que tive uma vida antes de ti, 
Bem diferente, por sinal. 
Já tinha visto o pôr-do-sol 
E o amanhecer 
Bem antes de te conhecer. 
Já rira e já chorara, 
Com ou sem razão E em muitos dias. 
Até já amara 
Sem saber que existias. 
Esse trajecto 
De toda uma existência 
Foi um repto 
Uma espécie de sobrevivência 
Que me tornou diferente. 
A mulher que encontraste 
Acabou 
Quando lhe demonstraste 
Que, como numa equação, 
Há igualdade 
Entre duas identidades 
E que mais do que a força 
Quem nos guia É o coração.

Soror S

Saudade

Não sei se é saudade 
Este vazio que sinto 
E que me escorre pelo corpo. 
Não! Talvez seja apenas a falta do teu corpo, 
O sentir a tua pele a enxugar a minha, 
As tuas mãos a procurarem os meus dedos 
E a cruzarem-se com eles, 
O teu olhar que vem lá do fundo E
 se derrama sobre mim 
no justo instante em que acabas de me amar. 

Será mesmo que é só saudade 
Este vazio que sinto? 

SS