Uma irreverência entre a memória e a saudade


Há um fio ténue que liga a memória com a saudade. Chamei-lhe irreverência porque ele se move constantemente e em todas as direcções fazendo-me lembrar o vento que, vindo do mar, me afaga desde que nasci...


sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

IN MEMORIAM: ROSA LOBATO DE FARIA

SE EU MORRER DE MANHÃ Se eu morrer de manhã abre a janela devagar e olha com rigor o dia que não tenho. Não me lamentes. Eu não me entristeço: ter tido a morte é mais do que mereço se nem conheço a noite de que venho. Deixa entrar pela casa um pouco de ar e um pedaço de céu - o único que sei. Talvez um pássaro me estenda a asa que não saber voar foi sempre a minha lei. Não busques o meu hálito no espelho. Não chames o meu nome que eu não venho e do mistério nada te direi. Diz que não estou se alguém bater à porta. Deixa que eu faça o meu papel de morta pois não estar é da morte quanto sei. Rosa Lobato de Faria

RECORDEMOS A LETRISTA

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

RETRATO A SÉPIA

Nada em mim faz supor uma existência pintada em cores garridas contrastes fortes ou artístico preto e branco. Nem sequer Tenho uma história para contar. O meu quotidiano É perfeitamente vulgar Árido em sucessos E se tem novidades São as colhidas nos jornais. Representável? Talvez a ânsia de viver E de atravessar o tempo Sem olhar para trás. Guardo o passado Mas estou aberta ao futuro. E porque estes meus conceitos São algo de difuso Entre a cor e a sua ausência Para me definirem Só desenhando-me a sépia. SS

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

NO TEU POEMA

A música portuguesa tem tido momentos muito altos. Entre eles é de apontar esta poesia que foi divinamente cantada por alguns dos nossos melhores cantores. Foi lançada pelo Carlos do Carmo, num festival da canção. Também a cantaram Simone de Oliveira e Dulce Pontes. Vamos recordá-la No teu poema existe um verso em branco e sem medida, um corpo que respira, um céu aberto, janela debruçada para a vida. No teu poema existe a dor calada lá no fundo, o passo da coragem em casa escura e, aberta, uma varanda para o mundo. Existe a noite, o riso e a voz refeita à luz do dia, a festa da Senhora da Agonia e o cansaço do corpo que adormece em cama fria. Existe um rio, a sina de quem nasce fraco ou forte, o risco, a raiva e a luta de quem cai ou que resiste, que vence ou adormece antes da morte. No teu poema existe o grito e o eco da metralha, a dor que sei de cor mas não recito e os sonhos inquietos de quem falha. No teu poema existe um cantochão alentejano, a rua e o pregão de uma varina e um barco assoprado a todo o pano. Existe um rio a sina de quem nasce fraco ou forte, o risco, a raiva e a luta de quem cai ou que resiste, que vence ou adormece antes da morte. No teu poema existe a esperança acesa atrás do muro, existe tudo o mais que ainda escapa e um verso em branco à espera de futuro. José Luis Tinoco

NO TEU POEMA

domingo, 31 de janeiro de 2010

TER-TE PERTO

Ter-te perto É saber que estás aí Não interessa onde, Nem como, Presente ou ausente Apenas que estás aí. Mesmo que não te ouça Te sinta ou te veja Saber simplesmente isso Basta-me. Desde que saiba que estás aí Nada me pode acontecer Porque estás comigo. A tua força dá-me energia E o teu querer vontade. Vejo o céu no teu olhar E sigo o teu rasto Nas pegadas de cada dia. Saber que estás aí Faz-me crer Que vale a pena esperar… SS